O Supremo Tribunal Federal (STF) suspendeu nesta quarta-feira (7) o julgamento de dois pedidos para restringir a tese que permite a responsabilização de jornais por declarações de entrevistados.
Um pedido de vista do ministro Flávio Dino interrompeu o julgamento. Ele argumentou que precisa de mais tempo para avaliar dois pontos específicos: o de jornais que teriam sido criados exclusivamente para produzir entrevistas difamatórias; e sobre a retirada do trecho que admitia a retirada de conteúdos.
Em agosto do ano passado, a Corte determinou que veículos de imprensa podem ser responsabilizados civilmente por injúria, difamação ou calúnia proferida por terceiros. O Diário de Pernambuco, condenado no caso específico, e a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) apresentaram embargos de declaração
Os embargantes argumentam que há trechos genéricos na tese de repercussão geral fixada pelo STF no ano passado, e que essas imprecisões podem levar a interpretações amplas nas instâncias inferiores. Na prática, eles alertam que a decisão pode facilitar o assédio judicial contra jornalistas e resultar em censura prévia, já que veículos de imprensa poderiam evitar a publicação de conteúdos de interesse público por medo de represálias.
Suspensão e proposta de ajustes
O ministro Edson Fachin propôs, nesta quarta-feira, ajustes na tese firmada pelo Plenário no Recurso Extraordinário (RE) 1075412 sobre a responsabilização de veículos de imprensa pela publicação de entrevistas que divulguem informações falsas, se não houve o cuidado de verificar sua veracidade.
A proposta foi apresentada em recurso em que o jornal Diário de Pernambuco pede esclarecimento sobre a decisão em que o STF confirmou sua condenação ao pagamento de indenização por divulgar informações falsas.
No julgamento, o STF estabeleceu que a empresa só pode ser responsabilizada se, na época da divulgação da informação, havia indícios concretos de que a acusação era falsa e que o veículo não cumpriu adequadamente seu dever de verificar a veracidade dos fatos e de divulgar esses indícios. Como a matéria teve repercussão geral reconhecida, a tese será aplicada a todos os casos semelhantes nas demais instâncias da Justiça.
Ajustes necessários
De acordo com o relator, os ajustes são necessários para deixar claro que a responsabilização ocorre em situações concretas, como o conhecimento prévio da falsidade da declaração ou a negligência na sua apuração e divulgação sem resposta da pessoa ofendida. Fachin propôs retirar da tese inicialmente aprovada pelo colegiado a obrigação de remover conteúdo com informações que comprovadamente caracterizem injúria, difamação, calúnia ou mentira.
Em relação às entrevistas ao vivo, o ministro considera que o veículo não pode ser responsabilizado se o entrevistado acusar falsamente alguém de praticar um crime. Para evitar isso, o veículo deve assegurar o direito de resposta em iguais condições, espaço e destaque.
Reflexões adicionais
O ministro Flávio Dino mencionou a existência de veículos criados na internet com o propósito exclusivo de difamar, utilizando entrevistas encomendadas para esse fim. O ministro Alexandre de Moraes concordou, destacando a prática de “lavagem de notícias” por blogs e serviços de streaming que divulgam notícias falsas por meio de entrevistas. Moraes também enfatizou a necessidade de considerar a remoção de conteúdos ilícitos para evitar a perpetuação da difamação na internet.
O julgamento será retomado após a análise detalhada dos pontos levantados pelo ministro Dino e as considerações dos demais ministros.
Processo
A decisão do Supremo sobre responsabilização da imprensa foi baseada em ação na qual o ex-deputado federal Ricardo Zarattini Filho processou o jornal Diário de Pernambuco por danos morais, em função de uma reportagem publicada em 1995. Na matéria jornalística, o político pernambucano Wandenkolk Wanderley afirmou que Zarattini, morto em 2017, foi responsável pelo atentado a bomba no aeroporto de Recife, em 1966, durante a ditadura militar.
Ao recorrer à Justiça, a defesa de Ricardo Zarattini disse que Wandenkolk fez acusações falsas e a divulgação da entrevista gerou grave dano à sua honra. Segundo Zarattini, o jornal reproduziu afirmação falsa contra ele e o apresentou à opinião pública como criminoso.
O Diário de Pernambuco alegou no processo que a publicação da entrevista se deu no âmbito da liberdade de imprensa, protegida pela Constituição.
O jornal foi condenado pela primeira instância ao pagamento de indenização de R$ 700 mil. Em seguida, o Tribunal de Justiça de Pernambuco anulou a condenação e entendeu que o periódico apenas reproduziu as falas de Wandenkolk Wanderley e não fez qualquer acusação a Zarattini.
Posteriormente, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) revalidou a condenação, e o caso foi parar no Supremo, que manteve a condenação do jornal ao entender que a publicação atuou com negligência sem, ao menos, ouvir Zarattini.
Informações extraídas do site BNews